Dorival
Caymmi: sintaticamente poético.
Ronye Márcio Cruz de Santana[1]
RESUMO
O presente artigo tem a finalidade de analisar a
poética de Dorival Caymmi pelo viés da gramática no que tange respeito a
análise sintática e a fluência simples das orações coordenadas e subordinadas
na canção Tão só desencadeando uma
imagem simbólica entre o amor e a solidão que são temas recorrentes na poética
e na melodia caymmiana.
PALAVRAS-CHAVE:Dorival Caymmi; poética; Análise
Sintática.
ABSTRACT:
This article aims to analyze the poetic Dorival Caymmi
the grammar bias regarding respect for parsing fluent and simple coordinate and
subordinate clauses in the song Tão só (So
only) triggering a symbolic image between love and loneliness are recurring
theme sin the poetry and melody caymmiana.
KEYWORDS: Dorival Caymmi; Poetic; Syntactic Analysis.
1 INTRODUÇÃO
Caymmi é um poeta que musicalizou
suas poesias com arranjos simples e harmônicos dando uma melodia saudosista e
sofredora, por outro lado conseguiu entoar frases, orações ou períodos
encadeando sentidos poético por meio de organizações das orações coordenadas e
subordinadas e deixando sua poética carregada de analogias pelo objeto
referencial que é o mar, por isso é que ao cantar suas músicas percebe-se que
têm a sensação de maresia, de frescor da brisa, da marola em seus pés, da
sensação agradável de ser carregado pelo infinito do horizonte, todo isso pode
ser encontrado na forma melódica que Caymmi conseguiu colocar tanto na sua
poética quanto na sua canção.
Outro artifício gramatical que
Dorival utiliza muito é o deslocamento de termos acessórios ou expressões que
possam dar um sentido amplo ou restrito a sua canção dependendo da intenção que
ele quer passar ao ouvinte. As expressões, locuções ou interjeições que existem
na música reforça essa ideia de marola, frescor e uma sensação de liberdade.
A poética caymmiana é recheada de
frases simples e orações simples alternando-se em coordenadas e subordinadas,
no entanto essa cadência dá um sentido amplo referente a sua analogia – que é o
mar, mas dá um sentido restrito ao seu discurso poético, cuja letra deixa bem
claro a informação que ele deseja dar ao ouvinte, ou ao admirador de sua arte
do sentido que está explícito no texto poético.
2 A análise sintática como
princípio da construção poética na música Tão
só de Dorival Caymmi.
Para se construir uma obra
utilizamos como matéria-prima as palavras e suas relações internas e externas
pode agregar novos sentidos dependendo do ponto de vista de cada leitor, e essa
polissemia pode se tornar monossêmica a partir do contexto que cada palavra se
relaciona entre se dentro do texto.
E essa relação de dependência
externa que é a palavra em si ela se restringe na tessitura textual, pois ela
se molda a dependência do seu regente ou dominante – seja ela que núcleo for.
Já no contexto interno estamos falando das inferências que a palavra adquire no
discurso textual e essa inferência pode transformar as suas orações dependendo
do contexto correlacional e dependentes entre si.
Essa é uma das razões para que faça
um estudo sintático pelo olhar interno e externo da poética caymmiana a
desvendar os entrelaços da tessitura poética para Gramática Normativa.
Tão só[2]
Tão
só...
tão só...
tão só...
Sem ninguém
Bem sei que na vida
De mim ninguém tem dó
Tão só...
tão só...
tão só...
Sem alguém
Pra eu querer bem
E não ficar tão só
Todos têm sorte
E assim o destino
Ajuda em tudo e até no amor
Mas vejo com pena que a mim ele nega
O mais pequeno favor
Tão só...
tão só...
tão só...
Sem alguém
Pra eu querer bem
E não ficar tão só
Tão só...
tão só...
tão só...
Sem ninguém
Bem sei que na vida
De mim ninguém tem dó
Tão só...
tão só...
tão só...
Sem alguém
Pra eu querer bem
E não ficar tão só
tão só...
tão só...
Sem ninguém
Bem sei que na vida
De mim ninguém tem dó
Tão só...
tão só...
tão só...
Sem alguém
Pra eu querer bem
E não ficar tão só
Todos têm sorte
E assim o destino
Ajuda em tudo e até no amor
Mas vejo com pena que a mim ele nega
O mais pequeno favor
Tão só...
tão só...
tão só...
Sem alguém
Pra eu querer bem
E não ficar tão só
Tão só...
tão só...
tão só...
Sem ninguém
Bem sei que na vida
De mim ninguém tem dó
Tão só...
tão só...
tão só...
Sem alguém
Pra eu querer bem
E não ficar tão só
A canção Tão só na primeira estrofe é constituída de apenas dois verbos –
sei e tem – ambos são classificados como verbos transitivos diretos, sendo que
o primeiro é uma Oração Subordinada Substantiva Objetiva Direta em que há um
termo acessório deslocado que é – de mim
– e que a oração subordinada completa é – que
na vida ninguém tem dó de mim–completando assim o sentido do verbo sei e a palavra bem funciona como advérbio intensificando ou ampliando o sentido de
saber.
No último verso da primeira
estrofe percebe-se que o verbo tem como objeto direto o substantivo dó completando assim o seu sentido, - ninguém tem dó de mim - por ser uma
frase de sentido completa ela classifica-se como uma Oração Coordenada Assindética,
contudo complementa o sentido do verbo sei
fazendo dela uma subordinada. O que se pode observar em Faraco quando ele diz
que “ cada um dos processos permite apresentar a mesma relação sob ângulos
levemente diferentes (como dizemos mais tecnicamente, cada processo tem
diferentes efeitos de sentido).
Assim, (...) o evento-causa precede sintaticamente o evento-seqüência.” (2003,
p. 315)
A poética caymmiana é constituída
pelo evento-causa e por repetições da expressão– Tão só – que reforça a ideia pelo evento-sequência dando a entender
o encontro do homem com as ondas do mar e que seu vai-e-vemdá a impressão de
acalmá-lo e, ao mesmo tempo, de acalentá-lo e com suas frases curtas ele
consegue através da aliteração – reprodução do fonema nasal como o ão, m
e n - reproduzir o som do vento, que
por sua vez também é responsável pela formação das ondas.
No entanto, na segunda estrofe
vem o evento-sequência reforçando o evento-causa, pois ela completa e esclarece
o porquê dele ficar tão só e, ao mesmo tempo, explicar o sentido do último
verso da primeira estrofe.
A ordem completa das orações é -
(...) na vida,
ninguém tem dó de mim pra eu querer bem e não ficar tão só. Partindo dessa
formação discursiva tem-se a seguinte classificação: 1 na vida é uma locução adverbial que pode ser deslocada e inserida
em algumas posições nas frases. 2 (...) ninguém tem dó de mim é uma coordenada assindética, poie tem sentido completo. 3 (...) pra eu querer bem é uma Oração Subordinada Adverbial Final que segundo Terra (2001)
“(...) exprime circunstância de finalidade, entendida como o objetivo, a
destinação de um fato. ” (p. 241).
Ao observar
a oração pode-se perceber que ela está reduzida no infinitivo, sendo
originalmente assim – para que eu queira
bem balizando e deixando claro o sentido de uma Or. Sub. Adv. Final, pois
aparece a conjunção para que
indicando um objetivo que o autor pretende esclarecer ao ouvinte justificando o
sentido de que ele tenciona esclarecer no discurso poético.
Já na última
classificação que é - e não ficar tão só pode-se perceber também
que é uma Oração Subordinada Adverbial Final, apesar da conjunção aditiva (e) ela
assume a função de para queem que ela
agrega e amplia o sentido da oração anterior justificando o porquê de não estar
tão só. A oração desenvolvida é – e para
que eu não fique tão só – completando o sentido do verbo tem que por sua vez o evento-seqüência
completa a informação do verbo sei
que baliza a ideia do evento-causa elucidando a relação de dependência e de
coerência discursiva a partir da formação sintática dos versos compostos.
Na terceira
estrofe o primeiro verso que é – Todos
têm sorte – é uma Oração Coordenada Assindética, pois possui o sentido
completo que segundo Terra e Nicola (2009) afirma que as “Orações coordenadas são aquelas que, no período não exercem função
sintática umas em relação às outras. Uma oração coordenada, portanto, nunca
será termo das outras coordenadas com as quais se relaciona.” (p. 284a). Diante
desse conceito pode-se auferir que gramaticalmente as orações não se
relacionam, contudo discursivamente uma completa o discurso da outra ampliando
o sentido ou especificando-o.
Os versos 2
e 3 da terceira estrofe completam-se e se constituem como sujeito e predicado
da mesma oração na seguinte sentença - E
assim o destino ajuda em tudo e até
no amor – como se vê que o substantivo é – o destino – e o predicado – ajuda
em tudo e até no amor–classificando assim em uma Oração Coordenada Sindética
Conclusiva, já que a conjunção – e assim
– expressa esse sentido conclusivo no discurso e como deixa claro o conceito
que Faraco(2003) descreve esse conceito conclusivo ao caracterizar que essas
orações “expressam uma relação tal que a segunda sentença é uma conclusão
daquilo que foi enunciado na primeira.” (p. 316)Por essa razão é que ela
conclui o sentido do primeiro verso – Todos
têm sorte – caracterizando como Orações Coordenadas Sindéticas.
Entretanto a sentença – E assim o destino ajuda em tudo e até no amor – é composta por uma outra oração elíptica que é – e até no amor – pois o autor deixou o
verbo subtendido na oração para fugir das repetências e da quebra poética
discursivo em que originalmente seria assim – e até ajuda no amor – em que a sua nomenclatura é classificada como
Oração Coordenada Sindética Aditiva que dá uma ideia de inclusão/adição na
informação que o autor se propõe elucidar em sua poética.
O quarto verso – Mas vejo com pena que a mim ele nega– é
composto por uma Oração Coordenada Sindética Adversativa, por causa da
conjunção – mas – e, ao mesmo tempo
por uma Oração Subordinada Adjetiva Explicativa que é – que a mim ele nega –,
pois acaba explicando o sentido do substantivo – pena – dentro da ótica do autor-personagem nessa poesia.
Já o verso
– O mais pequeno favor – é o Objeto
Direto do verbo – nega – em que no
seu sentido completo é – que a mim ele nega o mais pequeno favor –
transformando essa sentença em uma Oração Subordinada Adjetiva Restritiva, pois
Caymmi delimitou o fato de negar ao
substantivo favor. Como podemos
observar a relação de regência e dependência dependendo do ponto de vista pode
mudar um discurso ou uma opinião do ouvinte atento ou não a sua ideologia
poética.
3 CONCLUSÃO
De acordo
com a análise acima percebe-se que o discurso poético pode ser constituído por
orações e as suas relações deixam claro o papel das palavras dentro da
tessitura discursiva, porém as falhas no discurso acabam ocorrendo por falta de
compreensão do leitor, por causa da falta de conhecimento das relações entre as
frases referentes a sua coordenação e a subordinação e da importância dos
termos acessórios para a construção de sentido textual reforçando
especificamente o discurso poético ou enumerando as qualidades ou atributos que
cada oração se constitui.
A poética
caymmiana é recheada de orações simples, no entanto confundo o leitor pelo
ponto de vista poético, pois nem sempre ele tem a preparação adequada para
compreender o discurso presente na música, já que sua competência linguística é
voltada para um discurso regional ou local tornando-o assim inapto para o
entendimento da construção sócio-poética de Dorival Caymmi em suas músicas.
Em suma, se
o leitor ou ouvinte não tiver uma leitura de mundo ou várias leituras ele não
conseguirá compreender as inferências textuais de sua poética, pois sua
construção é feita por meio de frases simples, porém bem elaboradas no sentido
coordenativo ou subordinativo com prima a Gramática Normativa balizada pelo
lirismo poético do seu tempo. É com essa vertente analógica do discurso que
Caymmi encanta mundo afora pelo seu lirismo e pela sua genialidade discursiva e
poética para a construção de suas melodias e canções.
REFERÊNCIAS
FARACO, Carlos Alberto. Português:
língua e cultura. Curitiba: Base Editora, 2003. (Ensino Médio, volume único).
TERRA, Ernani. Minigramática.
8 ed. 7 imp. São Paulo: Scipione, 2001.
TERRA, Ernani. NICOLA, José de. Português de olho no mundo do trabalho. São Paulo: Scipione, 2004. (Coleção de olho no mundo do trabalho, volume único)
[1]Acadêmico do Curso de Letras.
Trabalho apresentado na Disciplina Língua Portuguesa IV orientado pela Prof.ª
Ivanete.
[2]Esta canção foi copiada de: Link:
http://www.vagalume.com.br/dorival-caymmi/tao-so.html#ixzz34wdPxOk6. Acessado em 17 de junho de 2014 às 22h 05min.
Nenhum comentário:
Postar um comentário